Nesta
entrevista ao Diário do Comércio, o contador adianta que pretende formar um
grupo de trabalho para formular propostas à nova secretaria.
Sílvia
Pimentel
A Secretaria Especial da Micro e Pequena
Empresa nem saiu do papel, mas o Conselho Regional de Contabilidade do Estado
de São Paulo (CRC-SP) já se antecipou em colaborar com o organismo, que terá
status de ministério, com propostas visando melhorar a gestão dos pequenos
negócios. Será uma parceria especial, levando em conta todo o conhecimento que
os profissionais da contabilidade têm sobre a rotina dos micro e pequenos
empresários. "Conhecemos muito a realidade do segmento", afirma o
presidente do CRC-SP, Luiz Fernando Nóbrega.
Nesta entrevista ao Diário do Comércio, o
contador adianta que pretende formar um grupo de trabalho para formular
propostas à nova secretaria. Ele aborda a importância da contabilidade em
tempos de Sped e do processo de adaptação da contabilidade aos padrões
internacionais. E mais: Nóbrega revela como o excesso de exigências fiscais
gera conflitos entre o contador e o cliente.
Diário
do Comércio – Qual a sua opinião sobre o projeto recém aprovado pela Câmara que
trata da criação da Secretaria Especial da Micro e Pequena Empresa?
Luiz Fernando Nóbrega – Somos favoráveis à
criação e queremos estar inseridos neste processo. Os profissionais da
contabilidade são detentores de um conhecimento profundo das micro e pequenas
empresas brasileiras. Como essas empresas não têm uma estrutura completa, com
suporte de controladoria, finanças e de contabilidade, tudo é concentrado no
contador. Conhecemos muito a realidade do segmento. A nossa ideia é formar um
grupo de trabalho não só com pessoas do conselho de São Paulo, mas de entidades
que representam a profissão, como o sindicato das empresas, dos auditores,
peritos, para fomentar a nova secretaria com informações e sugestões sobre os
principais gargalos do segmento. Queremos contribuir com sugestões para que a
nova secretaria ajude a alavancar as empresas de pequeno porte.
DC – Por
que é importante para as pequenas empresas adequarem a sua contabilidade aos
padrões internacionais conhecidos como IFRS (International Financial Reporting
Standard). É caro adaptar os balanços à nova realidade?
Nóbrega – Não é um processo simples transformar
a contabilidade para os padrões internacionais, por isso é custoso. E hoje o
micro e o pequeno empresário não enxergam o benefício. Não enxergam como
investimento porque não têm ações na bolsa, não fazem transações frequentes com
o exterior. Eles só vão enxergar quando tiverem uma reciprocidade do governo,
seja por meio de incentivo tributário (carga menor para quem se adaptar), ou no
mercado financeiro, com taxas de juros menores. Isso é possível porque as
normas dão transparência às demonstrações contábeis. Quando existe transparência
é possível, por exemplo, um banco avaliar melhor uma empresa que vai tomar um
empréstimo se ela estiver dentro dos padrões internacionais. A instituição terá
mais clareza sobre a realidade da empresa. Só que esse benefício ainda não foi
assimilado pelo segmento. Quando o pequeno empresário começar a absorver as
vantagens, com certeza vai migrar para as normas internacionais. E tudo indica
que as pequenas empresas serão obrigadas a aderir num dado momento. E quanto
antes elas se prepararem, melhor. É preciso encarar as normas como investimento
e não como um custo.
DC –
Qual o prazo para a adaptação às novas regras contábeis? Há algum incentivo
governamental para quem aderir?
Nóbrega – As grandes empresas têm até o próximo
ano para se adaptarem. Nos bastidores, cogita-se que os bancos, especialmente
as instituições ligadas ao governo, deverão adotar taxas diferenciadas para as
empresas que apresentarem balanços no padrão IFRS. O governo não sinalizou com
incentivos tributários ou fiscais, o que seria muito interessante para aumentar
o interesse pela migração do padrão atual ao internacional.
DC –
Como está a relação contador/cliente? O acúmulo de trabalho, traduzido por
novas obrigações acessórias, vem prejudicando essa convivência?
Nóbrega – O cliente tem toda a razão quando não
vê naquele serviço adicional valor agregado nenhum. E de fato, não tem. O
cliente entende o esforço dos profissionais da contabilidade para cumprirem as
exigências do fisco. As obrigações exigidas pelo governo são crescentes, com
altas multas, prazos exíguos para serem cumpridos e muitas delas são
redundantes. Mas não trazem nenhum valor agregado para o cliente. Para o
governo, ao contrário, os benefícios são nítidos porque ele acumula informações
sobre o contribuinte, sabe quem vendeu, a quantidade e para quem. E para os
profissionais da contabilidade essas exigências são um problema. Essas
obrigações, que não são nossas porque somos apenas os intermediários, caem em
nosso colo.
DC – E o
que podem fazer?
Nóbrega – Temos de ir até o cliente orientá-lo
a nos subsidiar com informações, alertamos sobre os prazos de entrega e o valor
das multas. Estamos nos curvando. O governo manda o que ele quer, nós
cumprimos, repassamos para o cliente, que tem reticências em pagar pelo serviço
adicional.
DC – O
que, na sua opinião, poderia ser feito para minimizar eventuais conflitos?
Nóbrega – Se o governo exige cada vez mais
informações das empresas, que pague para os contabilistas. Seria uma ótima
ideia. Não precisa desembolsar nada. Conceda um desconto em nossos impostos ou
para o empresário que entregar no prazo e que esse desconto seja revertido em
nossos honorários. Não é justo arcarmos com uma carga tributária cada vez
maior, trabalharmos de graça para o governo e cada vez menos para o cliente. E
ele ainda tem que pagar a conta? O profissional da contabilidade poderia
agregar muito mais valor se fosse discutir um balanço com o cliente, uma
estratégia de redução de custo ou resolver algum problema financeiro. Temos de desenvolver
uma habilidade para lidar com isso.
DC – Com
o Sistema Público de Escrituração Digital (Sped), o fisco prometia reduzir o
número de obrigações acessórias? Essa redução de fato ocorreu?
Nóbrega – O Sped completou cinco anos de
vigência e na época da sua criação o fisco cogitou reduzir a quantidade de
obrigações acessórias. Mas, ao contrário, o número delas tem aumentado. As
antigas declarações exigidas se tornaram eletrônicas e perduram até hoje. E são
redundantes, gerando custo para as empresas e para os próprios profissionais da
contabilidade, que precisam de mão de obra para dar conta do acúmulo de
trabalho. A contabilidade demanda muita mão de obra, o que tem levado a
salários inflacionados. Estamos a ponto de ter um apagão de mão de obra. Hoje o
profissional preparado está sendo disputado no mercado e os empresários do
setor se esforçam para segurar os melhores.
DC – Em
relação ao Sped, a nova exigência parece não ter sido assimilada pelos
empresários.
Nóbrega – O empresário não entende muito bem –
e não precisa, na verdade – o que é essa obrigação. Só que ele é o astro
principal. Ele precisa nos dar condições para ajudá-lo a cumprir essa
obrigação. Os profissionais do setor não conseguem resolver o problema do
empresário sem o seu o envolvimento e predisposição para fornecer as
informações exigidas. E atualmente há Speds de todas as cores, tipos, gêneros e
credos e com prazos difusos. É uma gama enorme de obrigações e cabe aos
contadores cobrarem os clientes. E se a entrega não ocorre dentro prazo, quem
paga a multa é o profissional da contabilidade. É um jogo bem difícil e
injusto.
DC – O
CRC-SP tem aumentado a fiscalização para conter a atuação de maus
profissionais. Como vem sendo realizado esse trabalho?
Nóbrega – Firmamos até o momento convênio com
seis prefeituras para integrar as nossas bases de dados. Na maior parte das
operações ligadas à abertura de empresas na prefeitura há a figura do
profissional da área contábil envolvido, responsável pela operação. A ideia é
que a prefeitura consulte a situação do profissional para saber se está ou não
apto a exercer a profissão. Hoje, os profissionais se formam, passam por um
exame de suficiência e fazem um registro no conselho. Ele pode estar suspenso
por algum ato cometido, o registro está ativo, mas a pessoa não tem condições
de trabalhar. Cabe à prefeitura tomar a decisão que quiser. O órgão pode
denunciar ou bloquear o nome do profissional da sua base. Temos casos de
pessoas que se passam por profissionais ou que não estão com registro ativo.
Hoje, no Estado de São Paulo, há 140 mil profissionais aptos a trabalhar na
contabilidade.
DC – A
contabilidade é uma profissão do futuro?
Nóbrega – O curso de ciências contábeis está
entre os dez mais procurados por estudantes no vestibular. E isso é animador
porque há muita demanda por profissionais a ponto de os salários estarem
inflacionados.
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